sábado, 24 de março de 2007

Haiti: Eu vi assim

O DIA DO ENGARRAFAMENTO, parte 2
Porto Príncipe, Haiti, 28 de agosto de 2004.
Entre muitos carros e nenhum ferido, o que estava acontecendo no cruzamento era, pura e simplesmente, um nó que os haitianos conseguiram dar no trânsito. Não tinha nenhum carro batido ou arranhado, mas tinha tanto carro naquele cruzamento e, o pior, não tinha como sair, pois as duas pistas de acesso estavam trancadas com carros na contra-mão, inclusive. Aquela cena era o retrato do país. Chegamos, eu e os soldados lá e tive a infeliz idéia de tentar por alguma ordem naquele trânsito. Mandei um soldado fechar um lado do cruzamento e o outro fechar o outro, e eu fui conduzindo os carros para tentar desafogar um pouco aquele tumulto. Quando eu consegui parar dois lado e deixar um fluir, era só eu virar de costas que algum “malandro”, percebendo a brecha e percebendo que eu não estava cuidando ele, colocava seu carro na contra-mão e trancava o trânsito tudo de novo. Tentei, durante uns 30 minutos, ajudar a resolver aquele problema, mas vi que para resolver aquilo ali, eu teria que dar um tiro em alguém. Se pelo menos eles ficassem dentro dos seus carros e esperassem eu dar a passagem para eles tudo se resolveria rapidamente, mas não, além de descerem e ficarem fazendo uma gritaria ensurdecedora, tentavam me auxiliar no desafogo do tráfego e complicavam ainda mais a situação. Quando eu livrava um lado, virava as costas alguém vinha e colocava o carro ali, bem ao estilo brasileiro, aquele, de tentar livrar o seu e o resto que se lasque.
Nunca deixando de esquecer que eu também sou brasileiro, adotei a mesma tática dos haitianos: Se eles não queriam se ajudar, eu é que não ia esquentar a minha cabeça. Chamei os meus soldados e falei para fecharmos o trânsito e liberarmos, somente, a nossa viatura para seguirmos para a base. Os haitianos que se entendam nesse trânsito maluco. Fizemos isso. Trancamos a contra-mão e balizamos o nosso caminhão até ele chegar no cruzamento. Aos berros, fui abrindo espaço para ele passar, porém só poderíamos seguir reto e não dobrar a direita conforme o trajeto normal para seguirmos para a nossa base. A direita estava completamente trancada também. Fui abrindo espaço, abrindo espaço e conseguimos, saímos reto na esperança de adiante encontrarmos alguma rua à direita que pudesse nos levar até a base. Porém, essa rua a direita não aparecia e nós, cada vez mais, seguíamos reto em direção a “sabe-se-Deus-onde”.
(continua ...)

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