domingo, 17 de maio de 2009

Mestre Jonas

Nos já balzaquianos anos 70, Sá, Rodrix e Guarabyra escreveram um clássico do lado mais bicho-grilo da MPB: “Mestre Jonas”. A letra da empolgante canção é uma releitura da passagem bíblica Jonas e a Baleia, sobre o jovem que ouviu um chamado de Deus e fugiu para o mar, onde, por castigo divino, foi engolido por um gigantesco cetáceo. O Todo Poderoso deu uma amostra de porque tinha esta alcunha e libertou Jonas, que, mais do que depressa, com um peixe entre as pernas, voltou à terra para cumprir seu chamamento.

Pois na versão brasuca, Jonas adora viver na barriga da baleia. A Shamu mediterrânea oferece toda a segurança que o pobre rapaz jamais sentiu naqueles tempos de pão e vinho, ou de ditadura e repressão. Aceitar a baleia como alternativa era subverter a ordem, era ter uma alternativa. Além do mais, naquele tempo não havia navios pesqueiros japoneses, conduzidos a GPs e sonar, dispostos a separar todas as partes do maior mamífero na Terra para colocar-lhes códigos de barras.

Mas contestações à parte, viver na barriga da baleia, por mais incrível que possa parecer, nada mais é do que a clássica fuga descrita até nos mais fajutos manuais de psicoterapia e livros de auto-ajuda. “Dentro da baleia a vida é tão mais fácil”, diz a música, “nada incomoda o silêncio e a paz de Jonas”. Observação: lembrem-se que não havia celular na época.

E o folk rock à caipira segue com um verso decisivo para comprovar a minha tese: “quando o tempo é mal, a tempestade fica de fora”. Esta tormenta pode e está além das mudanças meteorológicas. É a segurança de não enfrentar as nuvens negras que aparecem em cima de nossas cabeças de vez em quando.

Quando temos que disciplinar os filhos, conduzir uma equipe de trabalho ou “discutir a relação”, dá vontade de fechar os olhos e se imaginar nesta barriga oca, espaçosa, quente e acolhedora. Mestre Jonas mantinha suas coisinhas, suas gravatas e até seus ternos de linho. Um verdadeiro casulo em alto-mar. A volta ao útero, o que justificaria a popularidade da música com as crianças.

Mas como gordura de baleia é matéria-prima disputada a bisturi na indústria de cosméticos, precisamos arranjar outras formas de fuga. Sessões de novela, Fifa Soccer, academia ou o clássico bar estão mais em voga. Mas nada disso funciona com mestre Jonas, que assinou um papel se comprometendo a acompanhar a Free Willy até o fim da vida, mais precisamente “até subir pro céu”.

Para aqueles que juntaram um dinheirinho, o mais perto do mar é uma casa na praia, com sorte um barco. Para quem não tem estas opções, quem sabe um aquário de água salgada com direito a um Nemo? Se a sua verba para fugas marinhas de emergência não dá nem pra isso, recomendo comprar um disco de Sá, Rodrix e Guarabyra por R$ 9,99 no Submarino.

2 comentários:

Charles disse...

Há ainda aqueles que moram em casas sobre o mar (se é que a baía de Guanabara ainda ainda é mar), construída com garrafas PET retiradas na própria baía (meios de fortuna).
http://www.flickr.com/photos/22551294@N08/2861156216/

Douglas disse...

Este post nasceu de uma discussão, aqui em casa, onde um alegava que a música era uma "inocente" crítica ao Regime Militar e outra dizia que se tratava de uma apologia às drogas, algo como a barriga da baleia ser o "Gnomo Plim", sabe?!
Não sei, talvez as duas versões tenham sentido.